Pescadores de Homens
(Lucas 5:1-11)
Onde quer que Jesus fosse, ele sempre arrastava uma multidão atrás dele. A mensagem dele era profunda, surpreendente, diferente e mais autoritária do que o ensino dos líderes religiosos dos judeus. Até mesmo os guardas enviados para prender Jesus voltaram sem trazê-lo, dizendo, “Jamais alguém falou como este homem” (João 7:32-46).
“Assentando-se, ensinava do barco as multidões” (5:1-3). Jesus aproveitava qualquer situação como palco para ensinar a quem quer que o escutasse. Ele ensinou durante a recepção de um casamento (João 2:1-11), enquanto caminhava pela seara (6:1-5; cf. Mateus 12:1-8; Marcos 2:23-28), nas sinagogas (4:16; etc.), nos montes (Mateus 5:1-2; Marcos 13:3-5; etc.), ou em qualquer outro lugar onde havia pessoas.
Em Lucas 5, Jesus se encontrava à beira-mar, seguido de perto pelo povo. É possível que algumas destas pessoas o estivessem seguindo desde Nazaré, onde ele pregou na sinagoga e afirmou que ele mesmo estava cumprindo alguns trechos messiânicos do livro de Isaías! (veja 4:14-30). Outras pessoas talvez viessem de Cafarnaum, onde Jesus operou curas milagrosas e expulsou muitos demônios (4:31-41). Ainda outras poderiam ter vindo das cidades da Judéia, onde Jesus havia anunciado “o evangelho do reino de Deus” (4:42-44). Por causa de tudo que viram e ouviram, estavam agora “ao apertá-lo...para ouvir a palavra de Deus” (5:1). E, conforme o seu costume, Jesus os ensinou.
“Faze-te ao largo” (5:4). Depois de ensinar a multidão, Jesus tornou o foco de seu ensino ao grupo de seus próprios discípulos. Há necessidade tanto de ensino público como de ensino particular. Às multidões, Jesus lançava a base de instrução do evangelho do reino de Deus, como no famoso “sermão do monte” (veja Mateus 5:1 - 7:29). Nas horas que ele passava mais a sós com um número menor de seus discípulos, ele desvendava alguns dos mistérios mais profundos da vontade de Deus (veja, por exemplo, Marcos 4:10-20). Estes homens em particular já haviam decidido que iriam seguir Jesus (veja João 1:35-42). Agora, porém, Jesus os chamou para segui-lo de uma forma especial, o que faria com que ele pudesse os tornar em seus apóstolos. Por isso, ele os separou da multidão, a fim de instrui-los mais íntima- e profundamente por meio de uma parábola “ativa” de pesca, na qual eles mesmos teriam a participação principal.
“Lançai as vossas redes para pescar” (5:4). Pedro, André, Tiago e João eram pescadores profissionais, ganhando as suas vidas na carreira que aprenderam e praticaram neste mesmo lago. Neste dia em que Jesus chegou para ensiná-los, eles já haviam passado a longa noite anterior numa tentativa frustrada de pesca. Quando Jesus pediu que colocassem as redes na água novamente, Simão Pedro reagiu rapidamente, dizendo, “Mestre, havendo trabalhado toda a noite, nada apanhamos...” (5:4). Afinal, quem era este carpinteiro para ensinar quatro pescadores como pescar? Ele obviamente não sabia que era melhor pescar de noite, e não de dia! Ele obviamente não sabia que os peixes estavam em outra parte do lago, já que Pedro e os outros profissionais haviam pescado a noite inteira sem sequer encontrá-los nesta região!
Porém, Pedro já conhecia a Jesus. Foi este carpinteiro que Pedro viu expulsar um
demônio da sinagoga em Cafarnaum usando apenas a sua palavra (4:36). Depois,
foi este mesmo carpinteiro que havia curado a sogra dele e muitas outras pessoas
(4:38-41). Por conhecer Jesus e o poder de sua palavra, Pedro se segurou no meio
de sua objeção e disse, “sob tua palavra lançarei as redes” (5:5).
“Apanharam grande quantidade de peixes” (5:6). Quando Pedro deixou de confiar na sua própria experiência e na sua própria sabedoria, ele escutou a Jesus, e o resultado foi surpreendente! Apanharam tantos peixes que as redes estavam prestes a se romper (5:6). Por causa da enorme quantia de peixes, Pedro e André pediram a ajuda de seus sócios, Tiago e João (5:7). E quando estes vieram, encheram os dois barcos “a ponto de quase irem a pique”! (5:7)
“Senhor, retira-te de mim, porque sou pecador” (5:8). A reação de Pedro indica claramente que ele acreditava estar na presença do Divino. Séculos antes, quando o Senhor apareceu a Isaías para comissioná-lo à sua missão, o profeta teve uma reação semelhante, dizendo: “ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de
impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos!” (Isaías 6:5). À vista do milagre desta pesca – algo como nenhum destes pescadores profissionais jamais havia presenciado – Simão Pedro se prostrou aos pés de Jesus, o adorando.
“Não temas; doravante serás pescador de homens” (5:10-11). Certamente, presenciar um milagre era algo apavorante. Mas Jesus, acalmando seu discípulo Pedro, explicou o sentido verdadeiro desta parábola da qual participavam. Da mesma forma que haviam sido treinados para pescar peixes, se seguissem as instruções de Jesus ele iria treiná-los para “pescar” homens. Admirados com o poder da palavra de Jesus, “deixando tudo, o seguiram” (5:11).
Observações gerais acerca de “pescar” homens
O trabalho importantíssimo de pregar o evangelho ao mundo não terminou com a morte de Jesus e seus apóstolos. De fato, Jesus disse que a morte e a ressurreição dele eram apenas etapas no plano de Deus para a salvação. Uma outra etapa necessária seria a pregação destas boas novas “a todas as nações, começando de Jerusalém” (veja 24:44-47). Portanto, este trabalho continuará até que o Senhor volte. Então, o que aprendemos daquele dia sobre a pregação do evangelho?
A “pesca” se faz por rede, e não por isca e anzol (5:4-6). Muitas pessoas praticam a “pregação do evangelho” como se fossem pescadores com anzóis. Preparam uma “isca” para atrair o maior número de pessoas – e quando estas enfiam o anzol nas suas bocas, dificilmente se desprendem. Muitos prometem “riquezas” ou “bênçãos” aos que frequentam as suas igrejas e pagam os dízimos com fidelidade. Outros oferecem “curas” ou “descarrego”, e ainda outros dizem ser os únicos que entendem a palavra da verdade. Com tanta isca por aí, ouvir o
“evangelho” acaba sendo apenas uma busca pelo que parece bem aos próprios ouvidos (veja 2 Timóteo 4:3-4).
Mas Jesus ensinava a pregação do evangelho na imagem de uma rede. Certa vez, falando acerca do reino do céu, ele disse: “é... semelhante a uma rede, que lançada ao mar, recolhe peixes de toda espécie. E, quando já está cheia, os pescadores arrastam-na para a praia e, assentados, escolhem os bons para os cestos e os ruins deitam fora. Assim será na consumação do século: sairão os anjos, e separarão os maus dentre os justos...” (Mateus 13:47-49). A questão não é de “atrair” as pessoas com doutrinas e grandes promessas. Antes, o que é necessário é de lançar a mesma rede do evangelho sobre todos, sabendo que “é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê...” (Romanos 1:16).
Deste modo, não cabe ao “pescador” decidir onde e quando irá “pescar” e nem mesmo qual “isca” irá usar. Quem prega o evangelho deve pregar a todo tempo e “a toda criatura” (Marcos 16:15; veja também 2 Timóteo 4:1-2). Se todo o evangelho for pregado, ele irá arrastar os homens, assim como peixes numa rede. Repare que este foi o trabalho do apóstolo Paulo, que explicou: “Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras” (1 Coríntios 15:3-4). Ele simplesmente decidiu nada saber entre eles, "senão a Jesus Cristo e este crucificado” (1 Coríntios 2:2).
A “pesca” terá sucesso apenas se for “sob a... palavra” de Jesus (5:5). Como os pescadores aprenderam, Cristo é a chave. Sem ele, nada pescaram, embora usassem todo o seu esforço e recursos. Com ele, num único lançamento da rede, pescaram infinitamente mais de que já haviam visto. A nossa experiência, as nossas idéias, as nossas maneiras de alcançar o mundo perdido não são nada sem ele. Pessoas influentes e até igrejas inteiras têm feito programas “em nome de Jesus” que nada têm a ver com ele e que não ajudam a ninguém no sentido de escapar do pecado (veja Mateus 7:21-23; 23:15; Colossenses 2:20-23).
Jesus disse: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” (Mateus 28:19-20). Assim, cristãos não são pessoas que aprenderam todos os pormenores da doutrina de Cristo. Cristãos são pessoas que, ao ouvirem o evangelho de Jesus, se submetem a obedecê-lo em tudo. As pessoas convertidas no dia de Pentecostes, por exemplo, pouco sabiam das doutrinas específicas dadas à igreja. Afinal, muitas destas doutrinas ainda não haviam sido reveladas. Portanto, após mostrarem seu arrependimento e serem batizadas, estas pessoas recém-convertidas “perseveravam na doutrina dos apóstolos...” (Atos 2:37-42). Mais tarde, os apóstolos iriam encorajá-los, dizendo “desenvolvei a vossa salvação...” (Filipenses 2:12), “desejai ardentemente, como crianças recém-nascidas, o genuino leite espiritual, para que, por ele, vos seja dado crescimento para salvação...” (1 Pedro 2:2), “crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo...” (2 Pedro 3:18), e muitas outras exortações semelhantes.
Ser “pescador de homens” exige uma mudança de “profissão” (5:10-11). Não obstante o que fazem para ganhar a vida, cristãos deveriam ter como profissão principal lançar a rede do evangelho. Quando fazemos compras, devemos lançar a rede. Na escola, no trabalho, ou no lazer, devemos lançar a rede, “de sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio” (2 Coríntios 5:20).
- por Carl D. Ballard